
É difícil eu começar escrever um texto pelo título. A regra é escolher o nome depois de terminado. Este não, o título do que eu quero dizer é justamente este.
Já ouvi de algumas pessoas que eu não tenho cara de motoqueiro. Meu patrão diz que eu sou um motoqueiro de luxo, afinal não há muitos de nós cursando ensino superior. Realmente eu enchia muito mais a boca pra dizer que estava dando aula no cursinho da Unesp ('nossa, e você dá aula pro pessoal de terceiro colegial?! e eles te respeitam?').
Dizer "tô trabalhando numa farmácia, entregando medicamentos" não soa muito glamouroso, mas a pose, a pompa e a circunstância não me interessam por hora. A época da Paschoalotto quis me convencer que pra ganhar algum dinheiro tem-se que fazer o sacrifício de perder algumas horas do dia. A minha teima maior com o pessoal do headfone era ter que entrar por aquelas portas e praticamente não viver por 6 horas, debaixo de um ar-condicionado, entre duas divisórias, na frente de um computador, feito um credor de uma coisa que nunca vendi.
Ser motoboy, ou no meu caso, estar motoboy, é justamente o inverso disso. Você está na Bela Vista e nos dez minutos seguintes está no Mary Dota, e depois no Estoril. Vendo a vida acontecer, a cidade funcionar, o sinal abrir pra você.
Um dia, quando eu ainda era um headfoner, fui fazer aula de carro de manhã, e tinha que voltar pra trabalhar. Saindo do centro de treinamento um moto-táxi me perguntou se eu precisava de uma corrida. Eu, que já ia ligar pro meu pai, disse que sim. No meio do caminho ele me disse que tinha que parar pra abastecer. Parou no posto, conversou com o frentista, cumprimentou outras pessoas, voltou sorrindo e me falou: "vamo lá."
Pensei eu com minha camisa social, esse é um cara que sabe o que é a vida. Ele não fica entre 2 divisórias cobrando pessoas que nunca viu na vida. Ele anda pela cidade, conversa com as pessoas, dá informações, ouve piadas novas, olha a bunda das universitárias atravessando a faixa de pedestres. Aquele dia eu descobri que o mototáxi é o conhecedor da existência urbana. Só ele e mais ninguém.
O motivo primeiro de eu ter entrado nessa foi pensando nessas férias: três meses de ócio em casa me deixariam caduco. Dois: o dono da farmácia me conhece desde que eu tenho 3 anos. Três: o salário é praticamente três vezes o que eu ganhava no cursinho. Não que eu seja mercenário, mas realmente a função me interessava.
Estar na rua o dia inteiro, indo levar o analgésico pra dor do povo realmente é uma experiência, dessas que não se tem outra chance de ter se você não agarrar logo, mesmo que ela seja estranhíssima aos olhos do senso comum. Quantas e quantas vezes eu não pensei que ia me arrepender irremediavelmente de largar a bolsa do cursinho e não me adaptar ao ofício de dizer 'isso, só dá um vistinho pra mim aqui', 'é, dá um autógrafo aí em baixo', 'tem que pegar a receitinha né?', 'isso, depois a senhora vê com o Wiliam certinho'. Hoje faz dois meses que eu to dizendo "Brigado eu!", e me faz bem escrever essas mal traçadas linhas por saber que eu sou o cara que anda pela cidade conversando com as pessoas, trombando com outros motoqueiros na Rodrigues Alves, abastecendo e dizendo Brigado amigô.
Mas talvez o melhor disso tudo seja ouvir de velhinhas coisas como:
__"Esse realzinho é prucê"
__"Tchau Jorginho, brigado filho. Cuidado com essa moto eim menino!"
__"Obrigado filho, vai com Deus."
Amém.
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4 comentários:
a pergunta que fica daquelas que te fazem sobre ser motoqueiro: o que é mais legal, dar informações pras velhinhas, usar jacketão de couro estilo Ghost Rider ou olhar pra bunda das universitárias?
o Jorge olha para a bunda das universitárias como ninguém.
minha mãe que o diga...
Jorge pervertido.
tsc tsc tsc...
eu amo moto,ganhar a vida emcima de uma teve ser alucianante.E perigo...poxa,a vida é um risco.Muitas começam já num acidente!
XD
gostei daq.Vou linkar vc.
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